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distinguem são as seguintes: sonora, grave, doce e muito concisa a sua grammatica he a mais regular de todas, offerecendo mui poucas anomalías nas suas regras.

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Ös livros mais antigos em sanskrit são os que se seguem: os Vedas, subdivididos em 18 vidjas, ou partes, abrangendo todos os ramos dos conhecimentos humanos desde a theologia até á musica; as Leis de Menou, ou o codigo civil e religioso dos Indios; o Mahabharata e o Ramayana, poemas epicos.

O alphabeto sanskrit, chamado Dewanagari, he composto de 52 lettras, ás quaes ha ainda que accrescentar um grande numero de grupos.

A maior confusão domina ainda, diz M. Klaproth, nos alphabetos europeus. Não se acha nelles o seguimento natural das consoantes, sem que possão descobrir-se as relações respectivas das consoantes produzidas pelo mesmo orgão, nem a propriedade que ellas tem de se substituir mutuamente. Esta propriedade dá logar a uma infinidade de variações, ás quaes difficilmente nos habituamos, em consequencia da irregularidade dos nossos alphabetos, que nenhuma relação tem com as linguas a que pertencem. Pelo contrario, o alphabeto do sanskrit he, pela sua bem ordenada disposição, muito mais philosophico, sem comtudo o podermos considerar como de todo ponto perfeito. 1

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Sobre a antiguidade deste idioma, ouçamos tambem M. Kla-. proth: «A perfeição grammatical deste idioma levou os seus admiradores a consideral-o como muito antigo, mas he de crer que essa opinião de grande antiguidade venha a soffrer quebra, desde que for examinado mais maduramente, e se houverem recolhido esclarecimentos que ainda faltão para bem resolver uma tão delicada questão. Em quanto ao mais, não parece provavel que o sanskrit fosse em tempo algum fallado; e a opinião de que este idioma he um aperfeiçoamento da lingua dos conquistadores indo-germanicos, he muito mais verosimil do que a de ser a primitiva origem das linguas actuaes do Indostão, do grego, do latim, do slavo, e de outras da mesma familia. Em todo o caso, porém, a antiguidade do sanskrit remonta ao periodo da nossa era, ou talvez mais acima. >>>

Deveramos talvez dar a este ponto especial (sanskrit) muito.

1 Veja o artigo Langues, já citado, e ahi se encontrará uma luminosa exposição das series de lettras e de grupos de lettras do sanskrit, seguida de observações e exemplos sobre o aperfeiçoamento de que carece aquelle alphabeto, que ainda assim, tal qual he, leva vantagem aos alphabetos europeus.

maior desenvolvimento, como assumpto de grande importancia; mas nem queremos alongar muito a nossa escriptura, nem convém, segundo o genero do nosso trabalho, apresentar mais do que breves apontamentos, ou antes indicações.

Definições.

Lingua-Idioma-Dialecto-Ethnographia— Autochtono-Nomada-Nação.-Lingua tem uma accepção mais lata, muito mais extensa e geral do que idioma, e muito mais ainda do que dialecto. No entanto, nos tratados de linguistica encontrão-se pela maior parte como synonimos os dois termos lingua e idioma, e perfeitamente distincto o termo dialecto, tal qual o definimos já.-A palavra Ethnographia devêra ser empregada para designar a sciencia que tem por fim a classificação dos povos; serve comtudo para exprimir a sciencia que se destina a apresentar a classificação das linguas, e talvez pelo motivo de se regular, ordinariamente, a differença dos povos pela das linguas que fallão. O termo linguistica foi tomado dos philosophos allemães, e he na verdade muito expressivo e proprio, mas não tem sido adoptado por todos os sabios; o termo glossographia parece não ter sido desviado da sua significação litteral e obvia; e finalmente o termo idiomographia, proposto por Malte-Brun, não tem sido adoptado. Autochtono devera exprimir uma idéa de creação, mas, seguindo o exemplo do sabio Humboldt, os ethnographos chamão autochtono ao povo, a respeito do qual se ignora que outro o haja precedido.—Nomada devêra exclusivamente referir-se aos povos pastores, como os cafres, e outros, mas encontrar-se-ha nos tratados de ethnographia como synonimo de errante.— Nação. Este termo póde ser tomado debaixo de tres pontos de vista,historico ou politico, geographico e ethnographico. No 1.o caso, considerão-se como nações distinctas aquellas que formão no seu todo um corpo politico independente, assim por exemplo chamâmos inglezes a todos os habitantes das Ilhas Britannicas, não obstante a differença de origem dos irlandezes, escocezes, e welches ou do paiz de Galles. No 2.° caso dá-se o nome de nação aos habitantes de uma região, que tem limites naturaes, independentemente das divisões politicas e das linguas differentes que fallão. No 3.o caso, o termo nação applica-se aos habitantes de um paiz qualquer, que fallão a mesma lingua e os seus diversos dialectos, independentemente das grandes distancias que os separão, da differença dos corpos politicos a que pertencem, e do estado diverso de civilisação em que se achão. He neste ultimo

sentido que chamamos portuguezes aos descendentes dos colonos que para as differentes partes do globo enviámos desde o tempo dos nossos descobrimentos maritimos. (Veja-se a este respeito o Discours préliminaire, Introduction à l'Atlas de M. Balbi.)

Bibliographia. Para não tornar muito extenso este artigo, não apresentamos o catalogo das obras, que podem ser consultadas sobre todas as questões relativas á origem, formação, e classificação das linguas; remettemos, porém, os leitores para Balbi, Introduction pag. 64 a 68; Klaproth, artigo Langues da Encyclopédie Moderne, no fim do artigo; o Sr. Alexandre Herculano, Panorama 14 de Dezembro de 1844, nota a pag. 393,onde, e principalmente em Balbi, se encontrarão apontadas as obras mais importantes sobre este assumpto.

Muito e muito haveria ainda que dizer a respeito da importantissima questão que nos tem occupado (filiação da nossa lingua); mas he já tempo de passarmos a outro assumpto,-tanto mais, quanto o que resumidamente deixámos apontado he bastante para se conhecer o modo por que a dita questão tem sido tratada, e quaes são os pontos que ainda carecem do desenvolvimento, em ordem a assentar-se uma doutrina corrente.

Vamos agora tratar da Lingua Portugueza, com referencia ás linguas orientaes, e ás modernas da Europa, a fim de assignalarmos a herança que a nossa recolheu das primeiras, e a influencia que recebeu das segundas. Será este o objecto do capitulo immediato.

CAPITULO V.

DA HERANÇA DE VOCABULOS e phrases, QUE A LINGUA PORTUGUEZA RECEBEU DAS LINGUAS ARABICA, ORIENTAES E AFRICANAS.

HIA eu tratando das differentes questões relativas à nossa lingua, e havia já fallado das excellencias, louvores, independencia e filiação della. Passarei agora a tratar da herança dos vocabulos e phrases que diversas linguas lhe legárão, e depois fallarci da influencia que tem recebido das linguas modernas, ou antes, da lingua franceza.

As duas obras mais importantes que tenios ácerca das lin

guas orientaes e africanas, incluindo a arabe, com referencia á portugueza, são as seguintes:

VESTIGIOS DA LINGUA ARABICa em Portugal, OU LEXICON
ETYMOLOGICO DAS PALAVRAS E NOMES PORTUguezes,
QUE TEM ORIGEM ARABICA, COMPOSTO POR ORDEM DA
ACADEMIA REAL DAS SCIENCIAS DE LISBOA.-Por Fr.
João de Sousa-augmentado e annotado por Fr. José
de Santo Antonio Moura.—1830.

GLOSSARIO DE VOCABULOS PORTUGUEZES DERIVADOS DAS
LINGUAS ORIENTAES E AFRICANAS, EXCEPTO A ARABE.
Por D. Francisco de S. Luiz.—1835.

Começaremos, como he de rasão, pelos «Vestigios da lingua arabica.»>

He incontestavel que da longa dominação dos mouros nas Hespanhas, resultou o ficarem nas linguas castelhana e portugueza, um grande numero de palavras arabes. Tot puræ arabicæ voces in Hispania reperiuntu", disse Scaligero, ut ex illis justum Lexicon confici possit. Foi este o motivo porque Fr. João de Sousa, socio da Academia Real das Sciencias, e interprete da lingua arabica, se deu ao trabalho de fazer a interessante collecção de que nos occupamos.

Para bem entrarmos na intelligencia do espirito e intenção que presidírão a este precioso trabalho, e a fim de avaliarmos o alcance que elle tem, he mister ponderar que Fr. João de Sousa tencionava ao principio restringir-se ás palavras arabicas que correm no uso vulgar. Este modo, porém, de tratar o assumpto era deficientissimo, por isso que ficavão assim excluidos um grande numero de termos, que se encontrão nas chronicas antigas deste reino, e nos documentos dos nossos archivos e cartorios; rasão porque o nosso author deu maior extensão ao seu Lexicon, ajuntando até ás etymologias arabicas algumas hebraicas, persicas e de outras nações, mas só a respeito daquellas vozes que podião ser tomadas como arabicas, e não o são effectivamente.

Já antes deste philólogo, outros etymologistas se havião occupado, mais ou menos, deste assumpto: Duarte Nunes de Leão, na «Origem da lingua portugueza,» Manoel de Faria e Sousa,

na «Europa portugueza,» Bluteau, no «Vocabulario, etc.» Mas o primeiro confundio muitos termos com os primitivos e originaes da nossa lingua, como por exemplo Açotea, Alardo, Alarido, Alçada, Alcatéa, Alcaçús, e outros, verdadeiramente arabicos. O segundo nem accrescentou, nem corrigío, mas diminuío, pois que, tendo Duarte Nunes contado 207 nomes arabicos, Faria só conta, e sem rasão, 106. Bluteau, segundo diz Fr. João de Sousa, teve pouca escolha na deducção dos vocabulos, ou por que ignorava a lingua arabica, ou porque seguío authores menos instruidos nella; no entanto servío-lhe de muito, porque achou nelle muitos nomes que outros não trazem.

He Bluteau um daquelles poucos homens, a quém a posteridade não se cança de tecer elogios, e de pagar um tributo de gratidão e de verdadeira estima. Razão he esta por que aproveitamos a opportunidade que se nos offerece para, de passagem, assignalarmos o muito que deve a nação portugueza a um estrangeiro, que consagrou longos annos ao estudo da nossa lingua, e a enriqueceu com um trabalho precioso, que faria honra a qualquer academia. Assim o reconhecerão entre outros muitos, os authores do Diccionario da Academia, dizendo: « O muito que o infatigavel e erudito Bluteau tentou fazer em beneficio da nossa lingua, de justiça deve merecer á nação portugueza não menor reconhecimento, do que a hespanhola dedica por igual motivo a D. Sebastião Covarrubias. O seu Thesouro da Lingua Castelhana, da mesma sorte que o Vocabulario portuguez e latino do sobredito Bluteau, forão os que anticipárão a ambas as nações o conhecimento da necessidade e fructo, que se dá em obras desta natureza.»>

Voltemos aos «Vestigios arabicos.» O author examina no prologo qual a razão da origem persica que elle attribue a algumas palavras, que no seu Lexicon apresenta como taes, e depois de algumas ponderações conclúe que os termos persicos vierão para a lingua portugueza, ou 1.o-immediatamente da Persia por occasião do commercio, ou 2.dos paizes em que ficárão reliquias dos antigos Godos, ou Scytas, como são principalmente Allemanha, Paizes Baixos, e Inglaterra, ou 3.o-dos livros facultativos.

Fr. João de Sousa faz preceder o seu Lexicon de uma explicação sobre o artigo arabico Al nas palavras portuguezas. Estą voz al, que no arabe he um artigo, passou a ser entre nós um signal no principio dos vocabulos para distinguirmos os que

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