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estranhas Nações, como succedeu ao nosso Gil Vicente, o qual, não só foi admirado e applaudido dos contemporaneos, mas fixou o gosto e interesse publico pelas representações dramaticas, mostrou á Europa a insufficiencia das traducções e imitações servís dos antigos Gregos e Romanos, estabeleceu um Theatro Nacional, e foi o Mestre de cuja Eschola sahio Lope de la Vega.

-Memoria SOBRE O ESTABELECimento da Arcadia de LisboaA, E SOBRE A SUA influencia na RESTAURAÇÃO da nossa LitteRATURA-por Francisco Manoel Trigoso d Aragão Morato.

Não tinha sido possivel destruir, ainda no espaço de mais de um seculo depois da restauração de Portugal, o pernicioso gongorismo. Eis que no anno de 1756 se alevanta a Arcadia, Sociedade Litteraria, que se propoz a formar uma Eschola de bons dictames e de bons exemplos em materia de eloquencia e de poesia, que servisse de modelo aos mancebos estudiosos, e diffundisse por toda a Nação o ardor de restaurar a antiga belleza d'estas esquecidas Artes.—Esta memoravel Sociedade tomou o nome de uma das Provincias da Grecia antiga, mais afamada pela Poesia e pela Musica, a Arcadia chamou Monte Menalo o logar das suas conferencias; cada um dos seas Socios, na qualidade de Arcade, adoptou um nome pastoril; tomou por empreza um meio braço, pegando em um podão, com a epigraphe «inutilia truncat»; e finalmente sujeitou-se ás disposições de prudentes e bem traçados Estatutos.-Os mais illustres dos Arcades forão os seguintes: Antonio Diniz da Cruz e Silva (Elpino Nonacriense); Pedro Antonio Corrêa Garção (Coridão Erimantheu); Francisco José Freire (Candido Lusitano); Manoel Nicolau Esteves Negrão (Almeno Sincero); Domingos dos Reis Quita (Alcino Micenio).-Lamentamos não poder acompanhar o sabio Author d'esta Memoria em toda a sua luminosa exposição; cumpre-nos, porém, recommendar a sua leitura, como fornecendo interessantes noticias para a nossa Historia Litteraria.

-Memoria com o titulo: Das origens e PROGRESSOS DA POE-
Antonio Ribeiro dos Santos.

SIA PORTUGUEZA

-por

Trata primeiramente da introducção do uso da poesia na Hespanha primitiva, e particularmente na Lusitania, e por esta occasião menciona a memoria honrosa que, no tracto das bellas-artes, deixárão de si os turdetanos e os callaicos, descendentes dos celtas, e herdeiros do gosto de poetar, assim como dos exer ci

cios da musica e da dança, em que os celtas sobresahião; sendo, porém de notar que d'esses primitivos tempos não ficou á posteridade, nem monumento algum da sua poesia, nem memoria do nome de alguns de seus poetas.-Trata depois do uso da poesia hespanhola nos tempos da dominação dos romanos, dos wisigodos, dos arabes, em cujo periodo muito florecerão os exercicios poeticos, embora não chegasse até nós monumento algum da poesia dos nossos maiores, salvo algumas composições metricas no latim barbaro d'aquella edade.-Tratando finalmente da poesia portugueza nos seculos XII e XIII, o Author não fixa ao certo a sua primeira epocha, mas conjectura que a poesia começou logo de figurar nos primeiros tempos da monarchia, isto he, no meado do seculo XII, contribuindo muito, no seu conceito, para que Portugal désse logar e honra á cultura da poesia, o exemplo que nos havia ficado dos arabes, o de differentes nações e provincias d'aquelle tempo, como a Allemanha, a Catalunha, Valencia e Aragão, a Provença e provincias meridionaes da França, e particularmente o maior trato e communicação que mantivemos com a Galliza, affeita desde a mais alta antiguidade ao exercicio de trovas e cantares.

Temos tambem duas Memorias: a primeira SOBRE AS ORIGENS DA TYPOGRAPHIA EM Portugal no sECULO XV., e a segunda SOBRE a HISTORIA DA MESMA NO SECULO XVIAntonio Ribeiro dos Santos.

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-por

Entra na esphera da historia litteraria de qualquer paiz a noticia da introducção e progressos da Typographia; e por isso houvemos por conveniente fazer honrosa menção d'estas duas Memorias, que tendem a esclarecer uma parte muito interessante dos annaes das nossas lettras.—O Author tem por muito provavel que foi Portugal das primeiras provincias, fóra de Hollanda e Hespanha, que receberão a arte typographica, podendo datar-se a sua entrada no nosso Reino pelos annos de 1464 ou 1465.-Menciona o Author os diversos generos da typographia, que entre nós houve nos seculos XV e XVI; as cidades em que se estabelecerão officinas typographicas; os impressores estranhos e nacionaes que então tivemos; as obras que sahírão d'esses prelos; o merecimento typographico das edições de Portugal, ornato, divisas ou marcas, ou cifras dos impressores. — Cre-se que a cidade de Leiria não só tivera officina typographica, antes mesmo que a capital do Reino, mas fôra a primeira

em toda a Hespanha que recebèra e exercitára a Typographia. Na primeira Memoria dá o author uma interessante noticia ácrca do famoso e raro Livro de vita Christi, impresso em Lisboa no anno de 1495 per os honrados meestres e parceyros Nicoláo de Saxonia e Valentino de Moravia.- Seguem-se ás duas Memorias dois Appendiccs: o primeiro trata dos privilegios e honras dos impressores de Portugal; o segundo dá uma breve noticia das cidades, villas e logares onde houve typographia nos seculos XVII e xviii.

-Temos uma Memoria com o titulo: DO COMEÇO, PROGRESSOS, E DECADENCIA DA LITTERATURA GREGA Em Portugal desde O ESTABELECIMENTO DA MONARCHIA ATÉ AO REINADO DO SENHOR D. JOSÉ 1-por Fr. Fortunato de S. Boaventura.

A Litteratura Grega foi professada e estudada com grande esmero entre nós, depois que a tomada de Constantinopla (1453), e a consequente queda do Imperio Grego, trouxerão à Italia illustres Sabios, que alli despertárão o gosto das Letras gregas, e resuscitárão na Europa culta d'esse tempo as obras immortaes de Homero e Pindaro, de Euripides e Sophocles, de Xenofonte e Thucidides, de Socrates e Platão. O periodo mais florescente da Litteratura Grega em Portugal he o dos fins do seculo xv, e quasi todo o seculo XVI. Desde os fins do seculo xvi até ao meado do seculo XVIII decahe sensivelmente esse ramo das Humanidades, até que no reinado do Senhor D. José 1, graças ao illustrado e transcendente espirito do grande Pombal, vêem os portuguezes um rapido clarão de renascimento dos estudos da Lingua Grega, clarão que, por máo fado se tem ído apagando quasi de todo. N'esta Memoria são mencionados os nomes de um grande numero de portuguezes, que até ao reinado do Senhor D. José se tornárão notaveis pelos seus progressos na Litteratura Grega, e enriquecêrão as nossas Letras com differentes traducções e escriptos diversos n'este genero.

-MEMORIA SOBRE o começo, progressos, e DECADENCIA DA LITTERATURA HEBRA CA ENTRE OS PORTUGUEZES CATHOLICOS ROMANOS DESDE A FUNDAÇÃO D'ESTE REINO até ao reinadO D'ELREI D. JOSÉ 1-por Fr. Fortunato de S. Boaventura.

He no seculo xvi que mais floresce entre os portuguezes catholicos romanos a erudição hebraica, podendo citar-se os nomes de Fr. Francisco Foreiro, Fr. Jeronymo da Azambuja, Fr. Heytor

Pinto, D. Pedro de Figueiró, o sabio D. Jeronymo Osorio, e seu sobrinho do mesmo nome, bem como o de alguns jesuitas, etc. etc.-Note-se muito attentamente que esta Memoria he só relativa aos portuguezes catholicos romanos, por quanto a respeito da erudição hebraica dos judeus portuguezes largamente escreveu o academico Antonio Ribeiro dos Santos, cujas Memorias podem ver-se nas da Academia Real das Sciencias.-É muito de ponderar, que a circumstancia de haver o Concilio de Trento declarado a authenticidade da Vulgata, foi parte para que se tivesse em menos conta o estudo da Lingua Hebraica; mas he certo que o Concilio nem tirou, nem podia tirar aos textos originaes a sua divina inspiração e authenticidade.

Temos uma Memoria com o titulo: DE ALGUMAS PARTICULARIDADES COM QUE SE PÓDE ACCRESCENTAR E CORRIGIR O QUE ATÉ AO PRESENTE SE TEM PUBLICADO SOBRE A VIDA E ESCRIPTOS DO CHRONISTA MÓR FR. BERNARDO DE BRITOpor Fr. Fortunato de S. Boaventura.

Nesta Memoria se encontrão curiosas e importantes noticias biographicas e bibliographicas ácerca de Fr. Bernardo de Brito, do qual diz, muito atiladamente, o author que se por acaso não tem obtido a palma da exactidão historica.... merece por certo a da pureza da linguagem, e da clareza do estylo.

Sobre o assumpto desta Memoria veja-se:

-Elogio do Doutor Frey Bernardo de Brito, Religioso de Cister, e Chronista Mór de Portugal, escripto em Evora a 2 de Abril de 1628-por Manoel Severim de Faria.

-Vida de Frey Bernardo de Brito, Monge Cisterciense, e Chronista Mór do Reino, escripta de ordem da Academia Real das Sciencias de Lisboa-por D. Antonio da Visitação Freire. Lisboa 1806.

1

N. B. Quando mencionarmos este escripto, por occasião da Critica Litteraria, citaremos tambem uma Memoria de Antonio de Almeida acerca dos erros historico-chronologicos da Chronica de Cister.

MEMORIA SOBRE A vida do chronista mór, FR. ANTONIO BRANDÃO, E o que se pode accrescentar ao CATALOGO DOS SEUS ESCRIPTOS, QUE VEM NA BIBLIOTHECA LusitanaFortunato de S. Boaventura.

-por Fr.

O erudito philologo diz á Academia, que, se ella acolheu tão

benignamente as noticias que lhe déra ácerca do chronista mór Fr. Bernardo de Brito, de melhor grado receberá as relativas a Fr. Antonio Brandão, chronista, por ventura, mais laborioso que o primeiro, e a todas as luzes mais exacto, e mais assistido das prendas que constituem o verdadeiro historiador.-Entra depois nos pormenores da biographia de Brandão, e, encarecendo o improbo trabalho a que o chronista se deu por espaço de dez annos, faz notar que elle examinára antigas inquirições, livros misticos, escripturas, doações, não só na Torre do Tombo, mas tambem nos cartorios principaes de Lisboa, e nomeadamentę nos da Camara e do mosteiro de S. Vicente de Fóra. Na mesma memoria estabelece um bem delineado parallelo entre os dois chronistas Fr. Bernardo de Brito e Fr. Antonio Brandão, que merece ser lido, e he de bastante instrucção. Na segunda parte da memoria dá uma noticia circumstanciada dos escriptos do chronista, até ao presente desconhecidos, dividindo-os em tres classes: 1.a opusculos proprios; 2.a opusculos duvidosos; 3.a monumentos consideraveis, que elle transcreveu por sua propria letra, ou fez transcrever por outrem. E para que se veja o quanto de interesse nos vae n'esta memoria, permitta-se-me transcrever aqui um formoso trecho da « Historia de Portugal » do Sr. A. Herculano, no qual, a proposito do desventurado Sancho, he eloquentemente engrandecido o singular merecimento de Fr. Antonio Brandão: «A desgraça é expiação, e a expiação santifica « o desgraçado. Não seremos nós que iremos assentar-nos sobre << a loisa de um principe, que morreu na terra estrangeira, tra→ <«< hido, abandonado, coberto de vilipendios e de calumnias, para << resumirmos n'um julgamento final quaesquer illações desvan« tajosas, que, ácerca d'elle, se podessem deduzir da historia do <«< seu reinado. Punir com as provas na mão os seus hypocritas inimigos, era um dever: era a compensação de quatro seculos << de desprezo, contra o qual uma das mais nobres intelligencias, « que Portugal tem gerado, foi a primeira em protestar. Nós, << que, na ordem dos tempos, como em tudo, estamos longe do «< illustre restaurador da historia patria, não fizemos senão col<«<ligir os materiaes, que devem completar a grande obra de jus<< tiça que elle encetára, porque, mais felizes, vivemos n'uma épo«< cha, em que a inteira verdade dos factos e a liberdade do pen<«<samento é, emfim, respeitada. »Admiraveis palavras, que revelão ao mesmo tempo, o os magna sonaturum, a sisudeza de um historiador grave, a generosidade de um homem verdadei

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