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Mais de um Escriptor caracterisa de elegante sua traducção dos Lusiadas; e para que os Leitores, a quem ella não fôr conhecida, possão, desde já, apreciá-la, aqui transcreveremos alguns versos:

(Epis. de D. Ignez de Castro.-Estavas linda Ignez, etc.)

«Ecce quiescebas Mondæ pulcherrima ripis
Etatisque tuæ captabas dulcia fructûs

Præmia, (sed multum requiescere gaudia vitæ
Non patitur fortuna ferox) tua lumina Mondæ
Stellati ripas lacrymis et fletibus augent,
Principis et Petri gratum tibi nomen, et altâ
Fixum mente manens manifestas montibus, herbis,
Floribus, atque rosis, hyacinto, albisque ligustris.
His animum incensum curis inflammat amore
Fæmina, et illustrat noctis cùm Luna tenebras
Sola domo mæret vacuâ, strato que relicto
Incubat illum absens absentem, auditque, videtque
Nobilium Princeps thalamos jam despicit, Agnes
Pectore sola manet, solam sociare sodalem
Constituit Petrus, sibi stat sententia menti,
Conjugio Agneti tandem se tradidit illi.
Improbe amor, sic tu mortalia pectora cogis!
Etc.

(Canto 4.-Depois de procellosa tempestade, etc)
Post pluvias, imbres, nimbos, sævam que procellam,
Nocturnam que umbram, furiosi et flamina venti,
Sol oriens radiis tranquillat nubila claris,
Imbelli gelidum removet que à mente timorem,
Dat quoque spem portûs, statio tutissima nautis
Apparet, nigras pellit sol lumine nubes
Resplendens. Lusis sic fortibus accidit, atra
Postquam Fernando fatalia filia recidit
Atropos, et populos, et regna cadentia liquit.

Etc.

(Epis. do Adamastor.-Porém já cinco sóes erão passados, etc.)

Sed jam quinque rates sulcabant salsa diebus
Æquora, tranquillos nigro mittebat ab antro
Æolus ad classem ventos, auram que quietam,

Cum nocte excubias agerent de more sodales,
Apparet nitidum conturbans aëra nubes,
Horrida, dira, ferox, capite supereminet alto.
Sic graves, et magno sic formidanda furore
Apparet: nimio torpent stupefacta timore
Membra, coit gelidus dirâ formidine sanguis,
Fervet arena freti, gemitus que ad sydera pontus
Tollit, et ingenti fremitu quatit unda recurrens
Insanas rupes; imo suspiria corde

Educens, lacrymans que preces ad sydera fundo.
Etc.

Muito mais quizéramos transcrever; mas o que deixamos copiado he bastante para despertar a curiosidade do Leitor a julgar por si proprio a traducção de que se trata.

Não se pense, porém, que damos á traducção latina uma importancia desmedida. Os Lusiadas são intraduziveis, e só no original podem ser avaliadas as suas admiraveis bellezas, as quaes se perdem na versão. Mas nem por isso deixamos de achar nimiamente severo a D. Francisco Manoel de Mello, quando no Hospital de Letras diz:

Bocalino. Cuydey que se queixava (Camões) de quatro traducçoens, e dous commentadores, que o tem posto na espinha.

Lypsio.Quaes são?

Author. O primeyro he o Bispo Frey Thomé de Faria, que o traduzio em latim, vindo de Targa, seu Bispado; porque pela fórma da tradução mais parece romance punico, que Romano.

No tomo 6.o, como já dissemos, vem as poesias latinas do famoso Fr. Francisco de Santo Agostinho Macedo, a quem Diogo Barbosa Machado chama «Varão verdadeiramente Encyclopedico, insigne Ornato da republica litteraria, e immortal credito de tres Familias Religiosas, que illustrou com seu talento;» e D. Francisco Manoel de Mello o appelida o memorioso e memoravel Macedo.

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São muito dignas de serem mencionadas as Theses que defendeu em Veneza no anno de 1657, e tinhão por titulo Leonis Sancti Marci rugitus litterarii.=Aqui as transcrevemos, para

demonstração da immensa erudição, e espantosa memoria d'este homem extraordinario:

1.a— De sacra scriptura, tum veteris, tum Novi Testamenti, de que ejusdem sensibus, versionibus, interpretatione, et expositione.

2.- De Romanorum Pontificum serie, successione, authoritate suprema, de que Conciliis Ecumenicis, ac eorum causis, Præsidibus, et doctrina.

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3. De Historia Ecclesiastica tum ab Adamo usque ad Christum, tum ab Christo, usque ad annum præsentem:

4.- De Sanctorum, et Græcorum, et Latinorum ætate, et doctrina; ac præcipuè S. Augustini, cujus opera omnia tur; sententiæ asserentur, defendentur.

exponen

5.-De tota philosophia, et Theologia Speculativa, et Morali, ac illius Scholis, præcipue Scholastica, Thomistica, Jesuitica, de que sacris Canonibus, et Instituitis, ac libris Juris Civilis.

6.a— De Historia Græca, Latina, Barbara, præcipuè Italia et Veneta.

7.-De Rhetorica, ac illius arte, ac methodo ad usum ita redacta, ut quamcumque quis quæstionem dicenti ponat, de ea extempore dicentem audiat.

8.-De Poetica ad mentem Aristotelis, de que illius formis, et versibus, Poetis præcipuè Græcis, Latinis, Italis, Hispanis, Gallis, oblata quavis materia extemporali, eam Poeta suscipiet, et versu describet.

Cuilibet disputaturo ponere, et rogare, quid velit licitum esto, a die Lunæ 26 Septembris 1667-Publicè in Ecclesia S. Francisci de Vinea Venetiarum.

<< Concorrêrão, diz Machado na Bibl. Lusit., a este litterario <«< combate os mayores Sabios, que aquella idade respeitava nà «Europa, atrahidos uns da admiração, e estimulados outros de «< inveja, de que hum homem se animasse, posto que ornado de «<sublime talento, á huma empreza, que ainda era ardua para << todos os Catholicos da mais douta, e florente Universidade. <<< Porem a experiencia os desenganou, reconhecendo que era Ma<< cedo animada Encyclopedia, e vivo erario de todas as Scien<«cias, as quaes possuia com tanta eminencia, que a tudo quanto «se lhe perguntou e arguio, se não equivocou em uma só pala

«vra, e muito menos se suspendeo pelo mais breve espaço a todas «as respostas que dava; antes, para evidente prova de como a «comprehensão do juizo, e felicidade da memoria se não tinhão << perturbado.com tão diversos argumentos, e logravão de huma << perfeita serenidade, emendou a hum dos arguentes hum Texto <«<da Escriptura erradamente citado, e a outro lembrou-lhe hum << verso de Virgilio, que lhe esquecêra, etc. »

A fóra os Latinistas Portuguezes, cujas producções são transcriptas no Corpus Illustr. Poet., devemos mencionar outros, que adquírirão grande celebridade, e são os seguintes:

Ayres Barbosa, André de Gouvêa, L. André de Resende, Marçal de Gouvéa, D. Jeronimo Osorio, D. Antonio Pinheiro (Bispo de Miranda e Leiria), Damião de Goes, Achilles Estaço, Diogo de Teive, e outros, que podem ver-se no § 294, pag. 246 e 248 da Noticia succinta dos Monum. da Ling. Lat. de J. V. Gomes de Moura.

D'entre todos, porém, he o mais notavel o grande Jeronimo Osorio, Bispo de Silves, denominado o Cicero Portuguez, o qual escreveu em Latim muitas obras, sendo uma, e a principal, a que tem por titulo: De rebus Emmanuelis Regis Lusitaniæ virtute et auspicio gestis libris duodecim. 1571.-Manoel de Faria e Sousa (As. Port.) faz o seguinte elogio a esta obra: «Sin algun descrimen es la mas felis despues de la de Titulivio. En la latinidad todos le conceden facilmente la palma de ser el mejor Ciceroniano: en la orden es singular, en el juicio es claro, en los reparos es agudo, en la gala es grave, e en todo es perfecto.>>

Vem logo depois d'este o douto Bispo de Miranda, D. Antonio Pinheiro.

-EVORA GLORIOSA, Epilogo dos quatro tomos da Evora Illustrada, que compôz o R. P. M. Manoel Fialho, da Companhia de Jesu. Escr. augm. e amplif-pelo P. Francisco da Fonseca da mesma Companhia. Roma 1728.

Na parte 5. d'este Livro, a qual tem por titulo=<< Evora Douta», se encontrão importantes noticias ácerca da Universidade de Evora, e dos Eborenses famosos nas Letras, antes e depois de fundada a Universidade.

Pondo de parte as noticias anteriores aos Reis portuguezes, e limitando-nos unicamente ao periodo posterior, encontrâmos já nos fins do seculo XIII, estabelecidos estudos regulares na Ci

dade de Evora, até que mais tarde apparecem e brilhão os Galvões, os Resendes, os Estaços, os Severins de Faria, Diogo Mendes de Vasconcellos, Jeronimo Osorio, Gaspar Barreiros, e outros que, ou nascerão em Evora, ou lá tiverão domicilio e longa residencia.

A pag. 409 da Evora Gloriosa, encontrão os Leitores um Catalogo dos Authores Eborenses; a pag. 416, n.o 273, começa a noticia ácerca da Universidade de Evora, e dos Collegios annexos á mesma; e finalmente, a pag. 425, n.o 736, a Bibliotheca Eborense-Academico-Jesuitica, sendo o primeiro nomeado n'esse Catalogo o Cardeal Infante D. Henrique, a quem o Author chama resplendecente sol, doutissimo, e Mecenate dos Letrados. N'este ultimo Catalogo são mencionados todos os livros escriptos pelos Padres da Companhia de Jesus, que forão Mestres ou Estudantes da Universidade de Evora.

Diremos de passagem que a Evora Gloriosa he um Livro, a cuja composição presidiu um admiravel espirito de ordem, de sorte que a sua disposição he sobremaneira methodica, regular e clara. O Author descreve a Cidade d'Evora debaixo do ponto de vista da sua Historia Politica, Religiosa e Litteraria, e n'este sentido divide a sua obra em cinco partes: Evora Profana, Evora Pia, Evora Pontificia, Evora Religiosa, Evora Douta. Na 1.a parte trata da fundação de Evora, do seu augmento, dos acontecimentos politicos de que foi theatro, ou em que os seus filhos figurárão; e dos varões que se assignalárão por serviços á patria; na 2.a trata dos estabelecimentos de piedade e de beneficencia; na 3. dá noticia do governo ecclesiastico de Evora desde os primeiros tempos do Christianismo; na 4.a descreve as producções dos Conventos; e na 5.a finalmente, que mais de perto nos interessa, traça a Historia Litteraria de Evora desde a mais remota antiguidade até ao seculo XVIII.

Achâmos muito galante uma advertencia do Impressor Romano da Evora Gloriosa, e pedimos licença ao Leitor para aqui a transcrever, por muito curiosa e ingenua:

-«Avertimento dello Stampatore.-La favella Portoghese è cosí poco usata in questi nostri paesi, che questa é la prima volta, che l'hanno parlato i miei caratteri, essendo necessario a tal fine, non solamente di formar nuove lettere, ma di più andar copiando l'Originale a maniera di quei, che copiano le pitture: maravigliandosi non poco i compositori di vedere, che parlavano colla Stampa cio, che non sapevano proferire con la lingua, e

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