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Pondo aqui termo á primeira parte d'este livrinho julgamos indispensavel recordar o que dissemos na Introducção, pag. 4, para fazer sentir que não registamos tudo o que os nossos apontamentos nos ministram:

«Se esta primeira tentativa fôr acolhida com indulgencia, não hesitaremos em dar publicidade a outra serie de exemplos que temos recolhido.»

COMPARAÇÕES NA LITTERATURA

COMPARAÇÕES NA LITTERATURA

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Seguindo o plano adoptado no capitulo antecedente, e no mesmo sentido em que nos occupámos com o sublime na litteratura, vamos agora apresentar uma serie de exemplos de comparações, que temos encontrado em alguns dos melhores poetas e prosadores antigos e modernos.

Dão as comparações um grande fulgor e realce á expressão do pensamento; e como avisadamente se disse já, são um dos signaes mais evidentes da distincção do espirito. Não servem sómente para tornar claro um conceito escuro, mas para o ornar, para lhe communicar uma certa graça e brilho, que um enunciado simples não póde attingir.

Ŏ espectaculo assombroso da natureza, as maravilhas da Creação, as scenas encantadoras ou terriveis do mundo physico, e até os phenomenos da vida moral... são a fonte inexgotavel onde o genio ou o talento e o bom gosto vão beber as comparações, que tão graciosamente enfeitam o discurso, lisongeiam o espirito, e deliciam o coração do leitor ou do ouvinte.

Cumpre, porém, que não sejam muito frequentes, nem prolixas, nem affectadas, nem triviaes e communs; mas tornar-se-hão apreciaveis se revelarem facilidade, graça e propriedade.

Não ha de ser escuro ou desconhecido o objecto de que se tira a similhança; absurdo fôra que désse menor clarão a luz que se vae buscar, do que o assumpto ou enunciado que se pretende tornar luminoso. 1

Se as comparações excellentes são o ornato brilhante do discurso, é certo que ainda mais longe podem chegar no seu prestimo. E com effeito, uma das vantagens d'este ge nero de figuras, é que a imaginação, apresentando-se-lhe um objecto similhante áquelle que se pretende pintar, descobre muitos aspectos interessantes, que aliás não poderiam ser suggeridos pela simples palavra2.

Os pintores que pretendem penetrar os segredos do es tilo primoroso, não desdenham estudar e até copiar os quadros dos grandes mestres. Assim tambem nos amenos campos das lettras, e na especialidade que ora nos occupa, encontrará a mocidade estudiosa um subsidio valioso, uma direcção segura, no estudo reflectido dos exemplos ministrados por distinctos artistas da palavra.

É esta a explicação do nosso intento no breve trabalho que passamos a offerecer á ponderação das pessoas que nos lerem. Os exemplos que vamos apresentar, meditados que forem por quem deseje instruir-se,-poderão talvez impressionar-lhe a alma, e contribuir para mais efficaz comprehensão dos preceitos didacticos, de si não muito attrahentes.

Não devemos apresentar de uma vez os numerosos exemplos que havemos colligido.

Assim succede que nos exemplos exarados n'este capitulo não veremos ainda todos os que se encontram em Ĥomero, Milton, o Tasso, Camões, e outros grandiosos genios. A seu tempo se demorarão em scena esses brilhantes luminares do engenho humano. Desde já, porém, Virgilio

1 Engenhosamente disse Quintilliano:

Quo in genere id est præcipue custodiendum ne id quod similitudinis gratia adscivimus aut obscurum sit aut ignotum. Debet enim quod illustrando alterius rei gratia assumitur, ipsum esse clarius eo quod illuminat. (Inst. Orat. Lib. vii, cap. 3).

2 Lições elementares de eloquencia nacional; por Francisco Freire de Carvalho.

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