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vingança. A dureza das suas pertenções julgava | desde a fundação da monarchia, esse nome a elle adoçal-a annunciando-se como um Messias que andam ligados tão nobres recordações, fipolitico, predestinado para regenerar as nações, e lhes restituir as liberdades usurpadas pelo despotismo, isto sem considerar que o seu lhes roubava a primeira dessas liberdades, e apoz esta todas as outras. Infelizmente para elle, os ministros da sua palavra não a prégavam como os apostolos, e se na mão esquerda arvoravam os emblemas da liberdade, na direita sempre luzia o ferro prompto a ferir os incredulos, isto apezar de que os francezes, para quem eram todas as conveniencias, tambem não achassem boa a liberdade á moda do seu imperador. A verdade era, que os povos antes de verem realisada a minima promessa de felicidade, sentiamse espesinhados pelos exercitos francezes, a quem era mister entregar os portos, as fortalezas, sustentar, vestir, tolerar os tão recommendados espingardeamentos, os desprezos, e mil outros ultrajes. Era quebrar uns ferros para receber outros mais pesados.

Nem se imagine que estamos poetisando. O tenebroso tratado de Fontainebleau cabalmente prova o que disemos. Nesse tratado, que para a Hispanha, então alliada da França, tambem não passara de uma bem merecida decepção, eramos nós, os portuguezes, equiparados uma fazenda de gado a dividir por muitos coherdeiros. Por elle, se chegára a ser executado, o Alemtejo e o Algarve teriam por senhor o ignobil principe da Paz, conde de Evora-Monte (65). No Minho, condecorado com o titulo de Luzitania Septentrional, dominaria uma creança de Parma, a qual, arrojada da Toscana ou Etruria, para o Douro, em breve iria daqui para o exilio. O resto do paiz, perdido até o nome de que goza

cava em deposito nas mãos do usurpador, para um dia pertencer a Luciano I, a Junot I, a Murat I, ou a qualquer outro parvenu. Se escapasse a estes, seria a final vendido ou trocado pela maneira mais util ao intruso possuidor. Consequentemente não era mui para espantar que os portuguezes, justamente indignados de tão desaforada politica, se erguessem contra ella, e cevassem as iras nos soldados francezes, que, embora mandados, sempre eram os instrumentos da tirannia e da ambição de sen amo. E se nos disserem que o mundo sempre assim se governou; que na omnipotente politica dos conquistadores a força constitue direito; que este direito tem feito nascer e desapparecer povos; que em fim aquella politica não estuda o direito das gentes, ou não o entende, ou modifica-o a seu sabor, responderemos que tambem os povos conquistados sempre que tem podido revoltar-se contra os seus oppressores, e punil-os, tem-no feito, e tem feito muito bem.

Quando, pois, o povo de Portugal com as lagrimas nos olhos, abandonava os seus lares, quando destruia as searas, e escogitava todos os meios de exterminar dominadores que não escolhêra, nem queria supportar, usava de um direito incontestavel, e obedecia antes ao instincto, do que ás fracas determinações dos regentes. A consciencia incitava-o a nunca pactuar com os inimigos da patria, e como que lhe mordia, quando não lavava os seus altares com o sangue dos seus profanadores; quando por todos os modos não atormentava os roubadores da sua propriedade, e os violadores da honra das suas familias. Os francezes reagiam, e foi assim que a guerra da Peninsula se tornou uma guerra de exterminio, entre os invasores e os invadidos. Todavia, cumprindo primeiro que tudo dizer a verdade, confessamos que diversas das atrocidades imputadas aos soldados de Napoleão, eram obra de certos portu

(65) Na carta regia de 2 de Outubro de 1797 (Campeão P. em L. tom. 3. pag. 82), referendada por José de Seabra da Silva, D. Maria I chama ao principe da Paz, D. Manuel de Godoy Alvares de Faria Rios Sanches e Savoia, seu primo; e pondo este primo muito acima da Casa de Bragança, declara que, em attenção aos grandes serviços antes e depois da fundação da monarchia, feitos a esta pelos ante-guezes perversos, a escoria da sociedade, que passados do mesmo respeitavel primo, o nomeia conde de Evora-Monte com senhorio para si e seus descendentes. No desembrulhar a genealogia de tão conspi

cuo varão, Seabra até o faz descender de D. Pedro I por D. Ignez de Castro, da linha de Francisco de Faria. Mas estes incensos queimaram-lhos quando elle morava nas alturas; logo que desceu, o conde de Evora-Monte eclipsou-se, e talvez também desappareceu o neto dos Farias, de Pedro I e D. Ignez, ficando só o Manuel de Godoy, Sic transit gloria mundi. 40. **

se aproveitavam da geral perturbação, para saciar odios e invejas. Temos ouvido isto a muitos compatriotas imparciaes e fidedignos (66).

do reino, e terminados os excessos inherentes á Assenhoreados os inimigos da segunda cidade liberdade de saquear, a tranquillidade prompta

(66) O Sr. Adrião Pereira Forjaz é do mesmo parecer nas Memorias do Bussaco pag. 41 e 49.'

mente se restabeleceu, e tres ou quatro dias | auros, finda em 12 de Abril de 1814, perdepois o Porto gosava socego como ha mezes tence á historia do paiz.

não via.

Bem ponderado o que fica escripto, não se carecerá de grande perspicacia para conhecer que a queda do Porto era um acontecimento não menos natural, do que infallivel. Pois o governo de Lisboa que parecia habitar nas regiões lunares, olhou-a, ou fingiu olhal-a, como um contratempo insolito, e impossivel, sem alguma coisa extraordinaria. Ora, esta causa a via elle na mais comezinha daquella nefanda epocha, a traição; mas como não podia ir ao Porto buscar traidores, procurou-os em Lisboa, e, como era de esperar, achou quantos quiz.

Em consequencia, na quinta feira santa, 30 de Março, varias pessoas foram prezas e lançadas nos carceres da inquisição, aonde sem se thes admittir justificação alguma, e para cumulo de maldade, sem os menores vislumbres de culpabilidade, os opprimiram por nove mezes, quatro dos quaes, incommunicaveis, jazeram nos segredos. Depois de infinitos tormentos, de infinitas angustias, e perdas de saude e fortuna, os suppostos traidores sahiram, mas para o desterro, aonde a terrivel manopla do absolutismo, e o injusto labeu da ignorancia, continuaram a perseguil-os (67).

Professo desde moço na ordem da Cartuxa, D. Antonio, mais por influencia da casa de Rezende, a que pertencia por bastardia, do que por outras coisas, ahi serviu as mais altas dignidades, que a final trocára pela séde episcopal do Porto, aonde obscuramente passava os dias, quando os francezes e hispanhoes se assenhorearam do reino.

A sua posição, a sua nullidade, e tambem a protecção de seu irmão ligitimo, o principal Castro, deixaram-no ahi viver tranquillamente, mas os seus actos tambem para isso concorreram. Como quasi todas, senão todas, as summidades da hierarchia ecclesiastica, elle se curvou prestes ao jugo estrangeiro, mas avantajouse-lhes muito em abjecção. Louvou as suas ovelhas por haverem-no imitado, agradeceu-lho, e pediu-lhes que continuassem a obedecer com o maior desvello aos poderes instituidos e ordenados por Deus para nos regerem e governarem, na certeza de que todos os que não lhes obedecessem, rezistiam á ordenação divina. Chamara alliadas e pacificas as tropas francezas e hispanbolas; declarava que quem as mandára entrar tinha sido previnido e armado por Deus de po der e sabedoria para as dirigir e nos fazer felizes, e accrescentava :

E não foram estes os unicos martyres da tyrannia regencial. Decorridos apenas 17 mezes, « Sim, o Imperador dos francezes, e Rei de quando Massena se avisinhava de Torres Vedras, « Iialia, o grande Napoleão, não poderia de oumais 48 infelizes, tão innocentes como aquelles, «tro modo servir-se de nós para augmentar a povoaram o Limoeiro, a Torre de S. Julião, é << sua gloria verdadeira, senão fazendo-nos felioutras masmorras de donde somente os arranca- «zes. Nem é crivel que na grandeza sem igual ram para os lançar na Ilha Terceira, tudo isto,« do seu coração, no ardente desejo da sua glojá se intende, sem elles primeiro serem ouvidos e convencidos.

e

Ora, o mais para notar é que, durante estas perseguições, pertencesse à regencia um homem, que tanto pelo seu caracter sacerdotal, como pela gravidade das suas culpas para com a nação, e para com o soberano, devêra ser bem indulgente. Este homem era D. Antonio José de Castro, ex-presidente da junta suprema, o mesmo a quem o principe regente em remuneração dos seus serviços acabava de escolher para patriarcha de Lisboa, e o mesmo tambem para cuja biographia aqui lançaremos alguns traços, visto que o ultimo periodo da sua vida de 72

(67) Quasi tudo quanto a este respeito escrevemos extrahimos do Camp. Port. em Londres.

« ria, podesse entrar em Portugal para outro « fim. Este grande Imperador, elevado sobre o << throno dos seus trtumphos, tem unido a elles « a gloria de fazer dominar a nossa sagrada re« ligião nos seus estados (68). »

Não nos consta que Junot exigisse estas pastoraes, e muito menos que as exigisse com ameaçes; quando porém isto acontecêra, quando o receio de incorrer no desagrado dos senhores de Portugal, movesse o prelado a fallar ao seu rebanho, havia meios de fazel-o sem lhe inculcar os seus oppressores como divindades, e sem com tanto escandalo faltar ao que á patria se devia. Mas o ulterior procedimento do bispo do Porto,

(68) Veja-se a pastoral de 5 de Dezembro de 1807, e principalmente a de 18 de Janeiro de 1808, Obs. pag. 133.

mostra-nos que á feitura de taes pastoraes menos presidiu o medo do que a idéa de mesquinhos calculos, e o ardor de acatar e agradar áquelles cuja dominação não presumia tão chegada aos paroxysmos.

Entre os feitos de D. Antonio, que mais auctorisam a nossa conclusão, collocâmos as cartas de 16 e 19 d'abril por elle escriptas ao governador Quesnel, bem como a de 22 de Maio endereçada directamente a Napoleão.

«rança, lembrando-lhes que uma nação pouco « extensa, e além disso docil e submissa ás leis, « não offerecia outra gloria ao grande Napoleão << mais do que a gloria de a fazer feliz.

« Por esta pratica antecipei eu as seguranças « de que foram depois orgãos os deputados meus « compatriotas. Tenho pois a gloria de os haver « antecipado, por ser o primeiro que annunciei << aos portuguezes a benevolencia de V. M. I. e <«<R. que outra coisa não lhes póde dar que não « seja segurança e felicidade.

A de 16, respondendo á em que o general The participa que com o seu estado maior irá as- « Eu os excederei ainda, se é que podem ser sistir á festividade da Pascoa, conclue assim:- « excedidos, nos sentimentos mais declarados de « Nós nos acharemos na nossa Sé.... e faremos << gratidão e respeito, que eu tenho a honra de quanto fôr do agrado de V. Ex.» - Na segunda, « transmittir, conjunctamente com os delles, á replicando ao mesmo general que se queixava de <«< augusta presença de V. M. I. e R., accrescenter sido durante a solemnidade incensado, apesar« tando-lhes as mais humildes e fervorosas orada sua expressa recusa em receber honras só devidas a seu amo, escreve-lhe o prelado:

a

«ções, que por meu caracter episcopal sou obriagado a fazer pela conservação e gloria da nossa « santa religião catholica, e as que o amor da patria reclama.

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« .... Porém V. Ex. como representante do << grande Imperador Napoleão, a quem a religião« a tanto deve, e a quem nós tribulámos sinceras « homenagens, como a nosso protector, nos pa<< recia merecer este pequeno tributo do nosso res<< peito e submissão. A egreja com gosto se presta << a honrar aquelles que a patrocinam, e promo« vem o seu culto, nós da mesma fórma lança<< mos mão de todas as occasiões que possamos «ter de os honrar: tudo quanto fazemos a esta « grande nação é pouco para o que merece. Nós << não cessàmos de pedir a Deos pela vida do a nosso soberano, Napoleão, o Grande, e por << aquelles que por sua ordem tão sabia e virtuoasamente nos governam, desejando sempre te« nham a mesma felicidade (69). »

O fetido incenso espargido nesta carta, tão as queroso como o que a Quesnel já se queimára no templo do Deus vivo, ainda com mais profusão foi despendido na de 22 de Maio. Eil-a na sua integra:

«Sire: A deputação portugueza junto da a pessoa sagrada de V. M. I. e R. acaba de << transmittir aos seus concidadãos uma carta, << que preenche dignamente o objecto da missão, porém que não augmentou a confiança sem li« miles que depois de muito tempo eu trazia cal<<culada com a grandeza e clemencia incompa

« A patria orpha, e incerta de quaes sejam seus destinos, é infinitamente digna de attra«hir as vista compassivas de V. M. I. e R.

« Eu rogo a Deus, Nosso Senhor, que haja em « sua santa guarda a pessoa sagrada de V. M. « I. e R. Porto, 22 de Maio de 1808. (Assi« gnado) Antonio, bispo do Porto (70). »

Resulta destes documentos, cuja veracidade

(70) Citado Camp. tom. 1.°, pag. 175. A carta da deputação portugueza a que o bispo se refere, é a que sob a data de 27 d'Abril (Obs. pag. 268) acabava de ser de Bayonna dirigida á nação, aconselhando-a a pedir a Napoleão um rei, e a submelter-se ao systema continental. Se esta carta é verdadeira ou apocrypha, e na primeira hypothese, se representa um acto espontaneo, não o podemos averiguar.

derado como affecto á causa do filho de D. Maria I,

O marquez d'Abrantes, pae, era geralmente consi

e mui contra seu gosto detido em França. Os mais signatarios foram os marquezes de Abrantes, filhos, Valença e Penalva, o conde de Sabugal, e visconde de Barbacena, o bispo de Coimbra, D. Francisco de Alves Pereira, irmão do duque de Cadaval, o marLemos, o bispo inquisidor geral, D. Nuno Caetano quez de Marialva, D. Lourenço de Lima, o prior-mór d'Aviz, Joaquim Alberto George, e Antonio Thomaz da Silva Leitão. A representação que se lê a pag. 62 14 enviados disse que eram um rancho d'homens quasi do tom. 1.° do Camp. em Lond., referindo-se a estes todos no desagrado do principe D. João, e o Obs. pag. « Assim que as tropas francezas entraram neste 184, declara que os nove primeiros foram nomeados « reino, minha voz pastoral aquietou publicae avisados para irem a Bayonna, em quanto os outros

<< ravel de V. M. I. e R.

« mente meus diocesanos, e garantiu sua segu(69) Camp. em Lond. tom. 2.o, pag. 89.

crê que a predicta carta de 27 d'Abril é mui verda

foram porque assim o entenderam. O auctor do Camp.

deira.

nunca vimos contestada, que D. Antonio exhauriu os ricos thesouros da sua vilania para agradar ao Sr. da Europa, e seus generaes.

Pois o sacerdote que em 22 de Maio se derretia em tão abjectas finezas, já em 20 do Junho seguinte, sem que neste curto intervallo occorresse na politica ou no procedimento de Napoleão relativamente a Portugal alguma mudança notavel, que justificasse as inconsequencias e a apostasia deste seu reverendo subdito, ou vassallo, conforme então se dizia, como presidente da suprema proclamava aos portuguezes por este theor: «Quiz a Providencia mostrar-nos a nossa vena tura: portuguezes, confiança no céu... Ás ar<«< mas, portuguezes, para nos libertarmos de << uns impios, de uns faccinorosos, de uns rou<<badores, que a titulo de protecção vem arran<< car as nossas vidas, e os nossos bens, »

E logo depois, em 30 de Junho: « Mas faltam « cavallos e arreios porque os francezes, desor«ganisadores de tudo quanto ha debaixo do sol, << arruinaram a nossa tropa a tal ponto, que não podessem temella. Perfidos! Como se engana<«< ram? o furor ministra armas aos portugue« zes... (71)

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Ainda mais. Este homem profundamente malicioso e astuto, mandava em 28 de Junho, e posteriormente em diversas medidas decretadas por elle em nome da Junta, abrir devassas contra os culpados no horroroso crime de traição à patria, e ao legitimo e verdadeiro soberano, não só desde 18 de Junho, senão desde que elle partira para o Brazil, de geito que mandava devassar contra si mesmo. (72) O seu fervor por um portuguezismo apurado no mais fino crisol subia agora tão alto, que não contente de dar traças para povoar os calhabouços do reiuo com traidores, recrutava para as chamas eternas boa metade de Portugal, quando fazia publicar o seguinte S.

« Por este ordenamos, e mandamos que todas « as pessoas de qualquer condição que seja de << um, e outro sexo, que sabendo, ou de vista, ou de ouvida contra qualquer sectario ou partidista do governo francez, e seus costumes, « e contra qualquer, que de algum modo seja <«< inconfidente ao real throno, á nação, e á pa« tria, e tenha dado disto mostras publicas ou

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(71) Ambas estas proclamações no Obs. pag. 425 e 444.

(72) Edital de 28 de Junho, e 2 de Julho no Obs. pag. 439 e 450.

« particulares antes ou depois da restauração fe<«<liz, de que gosamos, o vão delatar com todas << as suas circumstancias... debaixo da pena de << santa obediencia, e de excommunhão maior, a isso facto incurrenda a nós reservada (73).

É verdade que das suas culpas se quiz elle justificar na proclamação de 14 de Julho, aonde se escusa com as ordens deixadas pelo Principe, com os seus grandes peccados, e com a impossibilidade de resistir a dois exercitos. Porém essas escusas que elle achou boas para a sua defesa, e que até certo ponto na verdade o eram, porque não favoreceriam tambem essas pessoas contra quem se abriam as devassas, e fulminavam os anathemas?

Dir-se-ha que o fim das devassas era contentar uma população desenfreada e poupar-lhe crimes. Mas podia um Principe da Egreja, o presidente do governo supremo, em menoscabo de todos os principios da religião, da justiça e da honra, abaixar-se ante essa plebe sediciosa, e só para lhe saciar a raiva, sanguinaria, tão difficil de satisfazer quando ella se vè temida, e lisongeada pela auctoridade, atrozmente perseguir os seus concidadãos, tornando-se elle mesmo criminoso?

Elevado á presidencia do governo do Porto não por luzir nelle alguma qualidade que o tornasse para isso recommendavel mas por falta de bomens, por consideração para a sua jerarchia (74), e tambem sem duvida por se ignorarem quasi todas as suas baixezas para com os inimigos contra os quaes a nação se levantara, logo patenteou a grande ambição que o devorava arrogando-se o titulo de presidente governador, quasi todos os poderes da junta, e parece que até o commando em chefe do exercito. (45) Além disto

(73) Esta algaravia acha-se no edital de 6 de Julho de 1808 a pag. 555 da Col. de Delgado. A proclamação de 14 do mesmo, abaixo citada, vem no Obs. pag. 467.

(74) Foy no citado Titulo IV pag. 185 diz que D. Antonio não possuia a vontade que commanda, nen a habilidade que dirige, e que a sua edade o trazia afastado dos negocios especialmente desde a entrada dos francezes e hispanhoes. Com tudo as predictas cartas, e todo o seu proceder desde 18 de Junho de 1808, demonstram-nos que se elle vivia fóra da governança, não era por mingua de ambição.

(75) No alto da proclamação de 8 de Julho (Delg. pag. 556) elle se intitula-Governador Presidente da Junta do Governo Supremo instituida no Porto, e Provincias Unidas. No corpo della encontram-se estas nojentas bravatas do pastor monarcha... - Temos dado as possiveis providencias para formarmos um exercito

-

não tardou a perseguir e expulsar da junta dois dos seus melhores membros, o capitão Mariz, e o sargento-mór Luiz Candido.

Na vespera do dia destinado para o primeiro morrer, foram as duas victimas embarcadas para o Rio de Janeiro pelo crime atrocissimo de acharem mau o governo do Porto, ou o do seu pre

Dizem que estes militares, os quaes nos suc-sidente (76). cessos do dia 18 tiveram quinhão nada pequeno, convencidos logo da inaptidão do governo que acabavam de fazer escolher, pensaram em derribal-o, e que semelhante noticia, chegando aos ouvidos de D. Antonio, tambem este logo projectára prevenil-os, ou mesmo perdel-os.

Foi depois destes ensaios que o bispo se apresentou em Lisboa, aonde se estreára continuando com os collegas a perseguição das victimas de 30 de Março. A traição e a inconfidencia, palavrinhas cuja elasticidade para tudo ía ministrando ensanchas, eram então os crimes da moda. Posteriormente, quando já por demais sería ridiculo achar traições a favor dos francezes, appareceram traições contra a regencia e seus desacertos, com a differença que na punição das primeiras houve menos ferocidade. Não se passou de prizões e desterros: para as ultimas armaram-se patibulos e accenderam-se fogueiras.

Fosse porém isso; fosse vingança por se haver escripto ao principe regente, a representação que se lê a pag. 62 do tit. 1.° do Camp. em Londres, pedindo-se-lhe a convocação das antigas côrtes; (76) fossem os ciumes da suprema para com a junta inferior, como suppõe o mencionado Camp. pag. 238, ou fosse tudo isto junto, e mais alguma coisa, o certo é que no dia 5 de Mas não se cuide que em 30 de Março, e julho aquelles officiaes foram presos no paço epis-durante o longo martyrio das pessoas prezas nesse copal, aonde se faziam os sessões das juntas, e dia, fosse D. Antonio o unico membro da reque um delles, o Mariz, ouviu a voz de preso gencia culpado nos crimes de lesa-nação, e lesa da bocca de seu proprio presidente. magestade.

Para cohonestar este procedimento e tranquillisar o povo, a quem a prizão destes officiaes começava a alvoroçar, mui destramente se fez entre elle divulgar a nova da descoberta de uma traição de que os mesmos officiaes eram os primeiros cabeças, e o povo deixando-se facilmente embair, como é seu costume, os dois patriotas em poucos dias se viram processados e julgados, sabe Deus como. A Luiz Candido condemnaram-no à morte, e a degredo para Angola o seu companheiro de infortunio, porém nenhuma destas sentenças se executou.

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de tanta força e ordem, que ainda de longe (!!!) ponha em fugida o inimigo... Temos mandado vir um governador das nossas armas. . . · - Esta proclamação é feita em nome do prelado, e assignada só por elle. A proclamação de José de Mello Pereira, como vimos, chama-lhe general em chefe, e a fama publica não a desmente.

(76) Esta representação diz-se feita no Porto em junta do governo aos 23 de Junho de 1808, e continha um resumido quadro das nossas miserias. A copia que vem no Camp. declara que o original continha trez assignaturas, que ainda então (Julho de 1819) se julgava perigoso tornar publicas; mas em o numero das trez sem duvida entravam Luiz Candido e Mariz. Pelo menos é isto o que se colhe das seguintes expressões do Publicola, as quaes precedem a dita reprezentação...-Alguns dos que a assignaram estiveram para ser degollados na mesma terra em que arvoraram as Quinas Portuguezas.. mas a historia ha de revelar as abominações desse tempo...

decreto de 26 de Novembro de 1807 nomeou cinco governadores, contando-se neste numero D. Francisco Xavier de Noronha e Francisco da Cunha Menezes. Eram secretarios o conde de S. Paio e João Antonio Salter de Mendonça. Ora, estes dois governadores e o Salter servindo até que Junot no 1.o de fevereiro os despedira, foram a final reintegrados por Dalrymple, como mostrámos, e continuaram a servir até chegar a Lisboa a carta regia de 6 de julho de 1809 que dispensára Noronha e Menezes, organisando a regencia só com o bispo do Porto já patriarcha eleito, o marquez de Minas, c o monteiro-mór. Porém as instrucções que baixaram com o predicto decreto de 26 de novembro, supposto muito se sentissem da perturbação e pressa com que foram escriptas, assim como da ignorancia de alguns dos ministros, e do seu nenhum zelo pela honra e pelos interesses da nação, sempre ordenavam que os regentes defendessem as pessoas e bens dos portuguezes, provessem os logares de letras, os officios

(76) É do citado Camp. tit. 1. pag. 171 e 235 que resumimos estas noticias. O edit. de 29 de Junho, abi transcripto e no Obs. pag. 477, declara que Luiz Candido fôra condemnado a morrer pelo crime atrocissimo que não menciona. Esta omissão, que a ser involuntaria logo seria reparada, provando o contrario do que se affirma no edital, occasionou es reparos do Campeão, e os nossos.

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