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Apontarei um exemplo.

Quando eu întroduzi a aravéça Dombasle na minha Javoira, era curioso ver o que se passava entre os meus vísinhos. Fallavam com grande enthusiasmo a favor da araveça, os que já á tinham visto trabalhar, os outros, que ainda a não conheciam, de nenhum modo os queriam acreditar, de sorte que se levantaram entre elles grandes contestações. Tal é a negação para acreditar nas coisas novas, que até se duvida do que viram os proprios amigos e compadres.

No entanto a curiosidade trouxe casaleiros, trabalhadores, carpinteiros e serralheiros, em fim quasi toda a visinhança, a rodear a aravéça Dombasle nos primeiros dias em que ella lavrou nas minhas terras: quasi que podia dispensar abegão, porque todos queriam lavrar com ella.

Assenta, Sr Redactor, que esta gente toda não apre ciava o trabalho que a aravéça produzia? Pelo contrario, exaggeravam a sua bondade. Mas depois deste enthusiasmo, o que aconteceu? Vieram as indagações, o quanto custa, como se arma, como se desarma, quem á ha de concertar quando se quebrar, e os carretos ás costas dos burros e machos, e os dias perdidos para ir lidar com fabricantes que se não conhecem, e em quém a nenhum respeito se tem confiança.

Estas reflexões fizeram esmorecer mais de um animo atrevido, mesmo entre os mais ricos, que por via de regra não são os mais entendidos, é que apesar do seu dinheiro, perderam o animo ao saber as difficuldades que eu tive para pôr a aravéça a caminho.

Podia sobre objectos deste genero, apresentar muitos exemplos, mesmo em minha casa.

Se o Sr. Vidal concluisse de factos desta ordem, que nos fossemos contentando com as nossos coisas, em quanto o paiz não tem meios convenientes para generalisar as boas praticas, que se seguem mesmo em algumas dessas localidades, como a introducção e aperfeiçoamento de instrumentos, etc., isso, sim senhor. Mas dizer que a nossa charrua é superior a quantas ha nos paizes mais cultos, é querer ignorar o que vae pelo mundo, e, como já disse, fazer grande mal pela desconfiança que atêa no animo das pessoas que ignoram inteiramente a sciencia agricola, e começam a acreditar nos que tem estudado alguma coisa da materia.

Agora farci uma breve analyse dos cinco periodos do artigo do Sr. Vidal, servindo-me de alguns termos do officio ainda que isso atrapalha a vista do publico, e talvez tambem contribuisse no artigo do Sr. Vidal, para que V. não o julgasse como eu supponho que elle deva ser apreciado.

Para provar que a nossa charrua tem todas as vantagens das mais perfeitas, diz o Sr. Vidal:

1.° Que ella é a mais barata de todas.

Este argumento, para delle se concluir que é a que faz melhor serviço, é um pouco celebre. Se houverem duas charruas e uma fizer obra como tres e a outra como um; se a primeira custar 2 e a segunda custar 1; está claro que esta é relativamente ao seu serviço mais cara do que a outra, ainda que o seu preço seja de metade.

O pequeno custo dos instrumentos é coisa de grande vantagem, mas é só quando, elles correspondem ao serviço que devem prestar.

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As araveças de aivecas chatas, ou quasi chatas, compostas de um bocado de taboa forrado de ferro, ou não forrado, que isso não vem para o caso, foram as primeiras sobre que principiaram estudos verdadeiramente serios. Jeferson, e outros trabalharam por descobrir as leis da resistencia que offereciam as taes araveças, e depois de muito calculo, muita geometría, muita dynamica, e muita experiencia, conseguiram formalisar a curvatura das aivecas. A estes trabalbos seguiram-se os de Matheus de Dombasle, Thaer, c outros talentos principalmente dos engenhosos inglezes, que arranjaram com que a aiveca velha e teiró (a) ajustassem de maneira, que tudo formasse uma superficie unida; porque assim o trabalho era muito mais perfeito. No entanto, como este systema apresentava o grande inconveniente da aiveca ser fixa na araveça, proposeram-se premios, e premios avultadissimos para excitar alguem a estudar o modo de o remediar. Aconteceu, porém, que os maiores machinistas e agricultores, dos paizes mais cultos do mundo, não poderam conseguir que as araveças de aiveca movel fizessem trabalho correspondente ás outras.

Depois disto vieram as araveças dobradas, que appareceram primeiro em França o na Escocia, e depois se aperfeiçoaram.

Um dos nossos lavradores mais distinctos pelo seu saber theorico e pratico, o Sr. Le-Cocq, fez-lhe um grande melhoramento pela simplicidade que lhe deu, e collige-se de um artigo da Illustração Franceza, se bem me lembro de 1845 ou 46, que elle foi muito provavelmente o primeiro que o propoz.

Apesar de tudo, ainda hoje a araveça simples de aiveca fixa é a mais seguida nos paizes, aonde a agricultura está mais adiantada, o que até certo ponto prova a sua bondade, bem pesadas todas as circums tancias.

A respeito da facilidade da manobra, a araveça de aiveca fixa tem de certo a preferencia: 1.o não tem que mudar a aiveca: 2.° não tem que mecher a cega : 3.o não tem de ser arrancada no fim do rego, como acontece ás araveças, que marcam. Giram sempre de roda, sobre tudo em terrenos de uma certa grandeza. E regularisal-a no principio da lavoira que ella lá

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vae; é com esta que de certo, uma criança de 12 au introducção de muitos e variados instrumentos, como nos póde lavrar.

Eu, Sr. Redactor, não escrevo isto no Chiado, nem lavro no Rocio ainda hontem lavrei com a araveça Rozé ; e tambem conheço os rabellos, as araveças e os arados da terra.

O jogo dianteiro upido a qualquer destas araveças, para se the chamar Charrua, não muda nada ao

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Desafio, não só o Sr. Vidal, mas todo e qualquer lavrador, para que me abra um rego, que me volte uma leiva, que me corte raizes fortes, como a unbagata e a ralha-boi e outras, com a araveça da aiveca movel, como o faz a de aiveca fixa; seja Dombasle, Grangé, etc., com a mesma força de tracção, e com a mesma força empregada pelo lavrador que pega nos. rabellos. :

Sim, senhor, desafio-o e escolha-se o campo da batalha.

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Diz o Sr. Vidal no periodo 4.° que a leveza da nossa Charrua é muito attendivel. Sabe esse senhor que ha differentes numeros dos modelos das araveças aperfeiçoadas, para differentes forças de tracção, segundo a lavoira que se quer fazer?

Sabe tambem que lá nos paizes cultos se arranjaram machinas, para experimentar a resistencia das differentes araveças, em differentes circumstancias de peso, etc.?

Sabe que o augmento de peso n'uma dada araveça pouco ou nada influe na força de tracção, excepto quando este augmento chega a ser egual ao seu proprio peso e d'alli em diante ?

Sabe que naquillo em que influe seriamente a differença de peso, é na estabilidade do instrumento? Conhece os excellentes trabalhos de Matheus de Dombasle a este respeito?

De certo que não conhece nada disto, e bem o mostra no seu artigo.

semeadores, extirpadores etc. etc. que para mim são objectos de luxo na minha posição. Além disso o arado, para derregar como nós o usimos, é muito proveitoso, e com falguns aperfeiçoamentos, de certo que o não deveremos abandonar, antes de chegarmos ás circumstancias de adoptar o luxo da agricultura

Desejo, Sr. Redactor, que V. faça publicar esta minha carta no seu muito acreditado jornal.

Cazal da Barreira, no Concelho de Torres Vedras 19 de Março de 1851.

De V. etc. EMILIO DE ROURE AUFFDIENER.

DA DEPRECIAÇÃO DO OIRO (-).

321 Ha tempo que se manifesta no mundo um phenomeno assás notavel, mas que não é sem exemplo: vem a ser a alteração sensivel nas relações de valor que precedentemente existiam entre os dois metaes empregados na qualidade de moeda, o oiro e a prata. Parece que o oiro tende a depreciar-se de dia para dia. Durante os ultimos mezes do anno findo já tem perdido bastante do seu valor relativo, e este movimento de depreciação não pára. D'ahi procede uma certa perturbação, que inquieta com justo motivo; perturbação de que todos os povos devem naturalmente resentir-se, mas que se manifesta com caracteres differentes, e mais ou menos gravemente nas diversas nações, segundo está mais ou menos em desharmonia com os principios o systema monetario que seguem.

Em Inglaterra onde o oiro só é usado como moeda legal, a perturbação se manifesta por um cambio mui desfavoravel com o estrangeiro, em meio mesmo de circumstancias as mais proprias, a outros respeitos, para assegurar um cambio vantajoso. Em França, onde os dois metaes tem igualmente curso legal, se

No periodo 5.o diz o Sr. Vidal, que a nossa char-gundo uma relação fixa precedentemente estabelecida, rua serve para executar todos os trabalhos, que executaria a charrua a mais perfeita, e tendo sobre ella ainda vantagens!!

Parece-me que deixamos dicto demasiado, para provar o contrario, e póde o Sr. Vidal ter a certeza de que ainda ficamos com uma grande reserva de boas razões. O Sr. Vidal tambem nos dá a noticia de que a charrua se abre e fecha pelas cunhas (pescazes): note-se porém que é o regulador mais imperfeito deste mundo!

Talvez não saiba que ha muitos annos já que se usam teirós de ferro, com cavilhas para servir de regular a entrada dos dentes (rabiça), isto em casa d'alguns lavradores que tem aperfeiçoado os nossos arados e araveças. Este aperfeiçoamento não se conhece lá em Coimbra, segundo se percebe pelos cunhos do Sr. Vidal.Em Coimbra que encerra dentro dos seus muros uma universidade, com aula de agricultura ! É para lastimar que dalli se mandem proclamar tão alto idéas como as do Sr. Vidal.

Terminando esta longa e talvez fastidiosa carta, direi, que se não pense que, por eu deffender as araveças d'aiveca fixa, dispenso inteiramente os nossos arados e araveças. Não Sr., não os dispenso; e tanto os julgó necessarios que, ainda os conservo como já disse, e a razão é porque para os banir de todo era necessario a

manifesta-se pela emigração da prata e pela afluencia do oiro, que, muito caro até então, volta com abundancia a tomar o logar do outro metal na circulação..

Dizemos que este phenomeno não é sem exemplo ; nem elle tem coisa que deva assombrar ou desorientar a sciencia.Com effeito, não tem rasão o Jaurnal des Debats, affirmando em seu n.o de 16 de dezembro passado que a circumstancia actual é sem precedente. Sem ser necessario sahir da nossa historia, achar-se-hiam precedentes em grande numero, e sem ír busca-los mais além dos ultimos cincoenta annos. Em todo o tempo, apezar da lei franceza que pertendeu estabelecer uma relação constante entre os dois metaes, os valores relativos do oiro e da prata cstiveram sujeitos a variaçõos continuas. É verdade que estas variações geralmente não passavam de ligeis ras oscillações, nem eram de tal natureza que influissem sensivelmente no movimento dos metaes. Mas, no principio do seculo actual, appresentou-se outra muito mais forte, e que tinha acarretado precisamente as mesmas consequencias da que vamos presenciando.

(•) Artigo em que M. Ch, Coquelin trata tambem do sys. tema monetario francez.

Tambem não é verdade, como affirma outro jornal, | o Siecle, que este phenomeno achou desprecatada a sciencia economica. Ha muito tempo que a economia politica, se não predisse exactamente o que está suecedendo, pelo menos previu similhantes complicações, como inevitavel consequencia de abandonarem suas licções.

Sem nos determos, porém, com todos esses ditos, que no entanto tem o inconveniente de inquietar os animos, examinemos as coisas como ellas são. Procuremos primeiro indicar as causas da perturbação que se gera, determinar o seu caracter e alcance; e depois veremos quaes são as medidas de utilidade geral que as circumstancias actuaes parece deverem prescrever aos publicos poderes.

são porque não se sentiu, senão ha muito pouco tempo, a influencia desta medida no mercado europeu.

Orça-se em 300 milhões a quantidade de oiro que circulava na Hollanda no momento em que a desmoedação começou, e suppõe-se que todo esse volume de numerario quasi immediatamente refluiu sobre os paizes visinhos. Ainda desta vez temos de prevenir o leitor da exaggeração dos algarismos. Em primeiro logar não é realmente bem averiguado que a Hollanda tivesse 300 milhões em oiro no momento da desmoedação; até mesmo nos parece um tanto forte esta somma para um paiz pequeno, onde demais a mais não é pouco conhecido o uso dos titulos de credito. Mas embora fosse exacto o algarismo, egualmente não é averiguado que todo o oiro se retirasse daquelle paiz} Presume-se concorrerem muitas causas nestes ulti-ao primeiro signal da lei. Provavelmente a tudo isto mos tempos para a depreciação do oiro: umas, augmentando de um modo effectivo a quantidade offerecida, outras, diminuindo em certa proporção a somma das precisões.

deve dar-se muito desconto. Não póde, todavia, desconhecer-se que a medida decretada pela Hollanda não concorresse com as demais causas para a depreciação mui real que por toda a parte se manifestou.

De uma parte affirma-se, por exemplo, que a mi- As medidas projectadas pela Belgica são de menor: neração do oiro na Russia, que nunca excedêra nos consequencia. Tinha-se decretado precedentemente que annos anteriores a mais de 40 milhões por anno, se a quantidade de oiro cunhada pela casa da moeda belga elevára a 150 milhões em 1849, e suppõem-se desti- não excederia a 20 milhões, o que parecía sufficiente nada a augmentar no futuro. Ao mesmo tempo avalia- para a circulação do paiz, já saturada de moedas esse em 300 milhões a quantidade de oiro expedida da trangeiras. De facto, no momento em que a depreciaCalifornia n'um anno. Seriam, pois, ao todo 450 mi-ção começou, a quantidade cunhada não passava de lhões lançados de repente na circulação do mundo, sem que possa esperar-se, por ora, quando parará tão enorme producção. Digamos de passagem que não affiançamos estas quantidades. Nada ha tão vago até agora como a verificação da quantidade de oiro realmente extrahida, sobretudo da California. É comtudo inquestionavel que ha dois annos a producção deste metal excedeu a medida ordinaria: e que era difficil que um facto de tal ordem não exercesse alguma influencia no preço.

Por outra parte, ao passo que a producção augmentou, as precisões diminuiram, pelo menos de modo que dois paizes, a Hollanda e a Belgica, onde o oiro achava precedentemente grande sahida, renunciaram de um modo mais ou menos absoluto a emprega-lo de futuro como moeda legal, e mesmo effectuaram a reversão de parte do que possuiam para os mercados estrangeiros.

14 milhões. Recentemente propoz-se que não seria excedida esta quantidade. E nada mais houve ; accrescentando-se apenas alguns meios propostos para impedir mais copiosa importação de moedas de oiro francezas. Até o presente a Belgica não foi além destas medidas de prevenção, que não existem por ora, cumpre repeti-lo, senão em projecto: não se póde, pois, dizer que ella grandemente contribuisse pela sua parte para baixa do oiro.

Eis o contexto do projecto de lei appresentado em sessão de 7 de dezembro ultimo.

Artigo 1. E revogado o ́art. 1. da lei de 31 de Março de 1847 que decretou a fabricação de moedas de oiro de 10 e de 25 francos,

Art. 2. É auctorisado o governo a fazer eessar o curso legal dessas moedas fabricadas até á concorrencia de 14.646:025 francos.

Antes de fazer uso deste poder, fixará um prazo para as trocar nos cofres do estado pelo seu valor nominal.

Art. 3. As moedas de oiro estrangeiras cessam de ter curso legal na Belgica.

Art. 4. A presente lei será obrigatoria a contar da data da sua publicação.

Disse-se, e ainda todos os dias se repete. a propo sito da Hollanda, que este paiz foi o primeiro que se resentiu da perturbação produzida pela invasão do oiro californiano, e que em presença deste facto se appressou a tomar as suas medidas para prevenir as consequencias pela parte que lhe toca. E outro erro que importa rectificar. A decisão tomada pela Hollanda é Temos apontado as causas principaes do phenomeno de ha tres annos; foi adoptada em 1847, epocha em de que tratamos. Posto que serias, não eram taes que que mal se fallava na California, e a producção da devessem inspirar grande inquietação, nem mesmo esRussia ainda não tinha excedido a medida ordinaria: palhar nas relações commerciaes sensivel perturbação, é portanto, pelos motivos que a dictaram, perfeita-se desgraçadamente não se intromettesse a opinião a mente estranha a estes dois factos recentes. Tão só-aggravar o effeito, else, mais desgraçadamente ainda, mente é verdade ter sido concedido ao governo, em os vicios dos nossos systemas monetarios não promo virtude da lei promulgada na Hollanda para a des- vessem no meio de tudo isto mais prejudiciaes commoedação do ouro, o prazo de tres annos para pôr plicações. esta providencia em execução. Por isso não obstante a adopção e sancção do principio datar de 1847, só no anno passado se preparou a sua execução, que não foi consummada senão em o anno corrente. Eis a ra

Vejamos, entretanto, até onde alcança o effeito prodazido. O cambio da Inglaterra, onde o oiro só, de ha muito tempo, tem curso regular como moeda legal, com os principaes paizes da Europa, onde ao contra

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As principaes praças da Europa com que a Inglaterra effectua ordinariamente a negociação de seus valores, e por intervenção das quaes opera com o resto da Europa, são Paris, Amsterdam, e Hamburgo. As libras esterlinas de Inglaterra, sempre calculadas em oiro, computam-se por tanto ordinariamente pelos francos de Paris, os marcos de Hamburgo, os florins de Amsterdam que são moedas de prata. Posto que as relações entre estes valores sejam essencialmente variaveis, admittiu-se com tudo uma base geral de apreciação que de ha muito se considera como estabelecendo o par. Assim, pelos calculos desde muito tempo recebidos, o par do cambio de Londres sobre as tres referidas praças se estabelece do seguinte modo:

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Dizemos que estas avaliações foram admittidas como que estabelecendo a relação exacta da quantidade de oiro representada por uma libra esterlina e das quantidades de prata comprehendidas nas moedas francezas, hollandezas e hamburguezas. Conhece-se por tanto que esta relação é arbitraria e variavel; por isso na pratica, tem frequentemente variado. Em geral, póde dizer-se que, ha muitos annos, salvo os tempos de crise, a moeda de oiro ingleza excedia quasi sempre o par. Mas hoje não é assim. Demais disso, aqui tendes as relações que tem sido verificadas em differentes épochas.

Em Maio de 1847, no meio da crise financeira que assignalou esse anno, e n'um momento em que o cambio não era considerado favoravel á Inglaterra, a libra esterlina permutava-se da seguinte maneira:

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Por esta nova verificação do cambio vê-se que a li bra esterlina já desceu abaixo do par em Amsterdam e em Hamburgo, o que se não tinha visto havia muito tempo. E isto no meio de circumstancias todas favoraveis na apparencia ao cambio inglez, isto é, quando as exportações deste paiz para o estrangeiro se tem augmentado ainda mais do que as suas importações, e que parece que os outros paizes mais tem a pagar-lhe commissões do que a recebê-las.

Uma circumstancia para se notar no quadro precedente é que, tendo a libra esterlina descido já abaixo do par em Amsterdam e Hamburgo, mantinha-se ainda um pouco acima do par em Paris. Não nos deteremos na explicação deste phenomeno. Basta dizer que a baixa do oiro é progressiva, e que no momento em que escrevemos (Janeiro do corrente) a libra esterlina, tanto em Paris como nas demais partes, já não se troca senão abaixo do par.

Sem sahirmos do nosso paiz, temos, e infelizmente para nós, um meio assás directo de comprehender e explicar a mui real depreciação porque tem passado o oiro. Tendo pertendido a lei franceza, a despeito do curso natural das coisas, estabelecer entre os dois metaes preciosos, oiro e prata, uma relação fixa, segundo a qual, quer que devam trocar-se invariavelmente um pelo outro, resulta mui naturalmente que dos dois metaes aquelle que é avaliado pela lei abaixo do seu valor commercial, vae procurar refugio no estrangeiro. Até agora, era o ouro aquelle a que a lei não concedia todo o seu valor: por isso a moeda de oiro não se demorava em França. Á medida que se cunhava em Paris e entrava na circulação, apossava-se della a especulação, ou para fundil-a ou para transportal-a fóra do paiz, onde só ficavam quantidades minimas, destinadas a figurar nas algibeiras dos opulentos, ou a constituir as reservas de pequeno numero de thesaurisadores. Hoje é o contrario. A prata é que emigra, ao passo que o oiro recolhe do desterro para vir tomar logar na circulação. Circumstancia que prova, sem duvida alguma, que a relação estabelecida pela lei é hoje muito em vantagem do oiro. Esta relação, tal qual havia sido fixada pelas leis ainda actualmente em vigor, é de 15 para 1; isto é, o legislador calculou que um kilogramma de oiro valia 15 kilogrammas de prata, e quiz que as trocas dos dois metaes se regulassem constantemente por esta base. Nos Estados-Unidos, onde o legislador pertendeu egualmente estabelecer entre os dois metaes relação fixa, foi admittida a proporção de 1 para 16. Póde calcular-se que no decurso de 20 ou 30 annos, a verdadeira relação, isto é, a relação commercial, fluctuou geralmente entre estes dois limites extremos, e que foi commummente de 15. Se é verdade, como cremos, que em França o oiro está agora ao par, e talvez mesmo abaixo do par, resulta que a relação real, a commercial, desceu nestes ultimos tempos de 15 a 15. Tal é, em nosso entender, a medida bem exacta da depreciação que se tem manifestado.

(Continúa.)

LITTERATURA E BELLAS-ARTES.

A LITTERATUBA.

XII

(Continuado de pag. 810.)

O gesto airoso do idioma luso.

E com effeito, cada uma das linguas tem um genero particular, um modo especial de exprimir os conceitos, uma elegancia propria, diverso systema de tecer o discurso, distincta eufonia; donde vem que será absurdo introduzir em uma

322 A uma ponderosa duvida dava logar o assumpto proposto pela Academia, não determi-lingua, sem pausado exame e seria reflexão, os

nando a epocha desde a qual a nossa linguagem

devia dizer-se moderna. O illustre auctor do « Glossario,» attendendo a que nos principios do seculo XVIII, e com o reinado do Sr. rei D. João V começou a restauração da nossa litteratura, e consequentemente o estudo e frequente lição dos livros francezes-resolveu contar desde esse ponto a edade moderna da nossa lingua.

vocabulos, as frases, e os idiotismos de outra :

Ponde um bello nariz alvo de neve
N'uma formosa cara trigueirinha ;

O nariz alvo no moreno rosto,
Tanto não é belleza, que é defeito.

É de ponderar que não permanecendo as linguas sempre no mesmo estado, mas antes sofde haver maior similhança entre ellas em deterfrendo continuas alterações, póde dar-se o caso minadas epochas, e pelo volver dos tempos apresentarem já differenças muito caracteristicas.

Não consistem os gallicismos sómente nos vocabulos francezes introduzidos na lingua portuguesa contra o antigo e bom uso, e principalmente contra o genio della; mas tambem em certos modos de fallar, que embora conservem as palavras portuguezas, alteram todavia a fórma original do« Não é de admirar, diz um erudito philologo. idioma, e lhe dão um colorido estrangeiro, e alheio da sua naluresa. Conseguintemente, o << Glossario » seria muito imperfeito, se não indicasse tambem, como effectivamente indica, esses modos de fallar, viciosos em quanto a syntaxe, e mal soantes na nossa lingua.

Não teria a licção dos livros francezes sido prejudicial, debaixo do ponto de vista linguistico; se com ella não concorressem o fatal esquecimento em que deixamos os nossos classicos, e a falta de um bom Diccionario de ambas as linguas. Concorrendo porém, simultaneamente estas tres causas, foi consequencia necessaria, que não estando os leitores sufficiente premunidos com o estudo e conhecimento da sua propria lingua, e não podendo perceber com claresa e precisão a mutua correspondencia de vocabulos e frases, e o differente caminho que cada uma das duas linguas requer para explicar os seus conceitos, se introduziram os gallicismos, terrivel cancro que hia devorando a nossa boa linguagem, e tornando-a desengraçada, barbara e mal soante.

- Quero dar que em francez hajam formosas
Expressões curtas, phrases elegantes;
Mas indoles diff'rentes teem as lingnas;
Nem toda a phrase a toda a lingua ajusta.

Assim se exprimiu o illustre poeta portuguez, que no proprio seio da França pugnou valente em defesa da nossa lingua, e fez cruenta e desabrida guerra aos que, sem tino, afeiaram

<< que nos viesse tanta copia de termos da lingua << franceza porque no tempo antigo era esta lin« gua mais coherente com a nossa do que hoje. « Os francezes diziam, como os hispanhoes, si« que, por assim que, de modo que, de sorte « que etc. Souloir era em francez, como para nós « soer, ou soher, do latim solere; e os france«<zes deixaram aquelle termo quasi ao mesmo << tempo, que nós deixámos o nosso, em logar « do qual tomaram, s'accoutumer, e ètre ac« coutumé, costumar ou ser costumado. Diziam ◄ prouesses, como nós proezas, em logar de gran« des actions, de que hoje usão; moustier, como « nós mosteiro: moult do latim multum : ou como << os nossos antigos moito: Certes, como nós ha << pouco diziamos certo, por certamente, ou na << verdade. »

Além disto, é mister saber que o Conde D. Henrique veio de França com sua familia e tropas, e que esta colonia franceza introduziu entre nós muitos vocabulos e frases, que se naturalisaram e encorporaram no idioma portuguez. A rainha D. Mafalda trouxe muitas damas, e cavalleiros francezes; aportaram depois ás nossas praias os cruzados, que ajudaram o Sr. D. Affonso Henriques a tomar Lisboa, e se estabeleceram e mais tarde entrou em Portugal D. Affonso III em Portugal, povoando varias villas e logares:

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